Cinema: Invictus, de Clint Eastwood





Ontem a TV passou o filme Invictus, de Clint Eastwood. Uma das personalidades públicas que mais admiro, Mandela, e Clint Eastwood, um realizador sempre no top das minhas preferências, unidos por uma história inspiradora. Obrigatório ver!

Nelson Mandela, recém eleito, constata que a nível desportivo a sociedade africana também vive apartada. A equipa nacional de rugby é apupada pela maioria da população que prefere torcer pelos seus adversários do que pelos brancos e destreinados Springbocks. Esta equipa permanece um símbolo do apartheid, o verde e dourado das camisolas é repudiado por uma criança negra, que seria sovada pelas outras se se atrevesse a vesti-la, ainda que precisasse de roupa. Mandela irá colocar em risco a sua autoridade e testar o seu prestígio para lutar por uma ideia: a de que a equipa de rugby se pode tornar um instrumento de reconciliação da população. Por isso envia a equipa para o terreno de bairros de barracas, para aí realizar uma campanha junto das crianças, que só idolatram Chester, o único jogador negro que a incorpora. Quando deixam o local, um cartaz resume o desejo de Mandela, Uma equipa, um país. Para construir uma nação é preciso usar todos os tijolos disponíveis, não devolver o ódio, antes, pelo contrário, usar de compaixão e compreensão. Porque agora África vive uma democracia e são todos parceiros na reconstrução do país. Nelson Mandela é um presidente diferente, que quer que os guarda costas sorriam, que os conhece pessoalmente e a quem traz souvenirs do estrangeiro, eles não mais são invisíveis, diz um deles ao capitão de equipa Pineear quando este visita o presidente para tomar chá. Mandela foi capaz de ganhar as eleições mas o desafio maior é vencer no terreno os conflitos raciais, bater o desemprego, a criminalidade, ganhar o país. Será Pineear capaz de afrontar o medo, inspirar a sua equipa, aceitar e vencer o desafio de a colocar na final do Mundial de Rugby de 1995? A tensão que se vive entre a população espelha-se no grupo pessoal de guarda-costas que vê com maus olhos que Mandela tenha convocado os anteriores, que serviam Le Klerk, por serem bem treinados. Forçados a interagir em nome de uma missão maior, e graças também ao envolvimento progressivo na visão político-desportiva de Mandela, acabam o filme conciliados. Porque o importante é olhar para o futuro, para que África seja uma luz no Mundo, diz Mandela. O perdão liberta a alma. Remove o medo. Por isso é uma arma tão poderosa, diz ainda. Contra todas as expectativas os Springboks alcançam a final desportiva e defrontam os poderosos All Blacks, da Nova Zelândia, vencendo após um sofrido prolongamento de 20 minutos! O filme termina com a euforia nas ruas, a nação arco-íris festeja, brancos e negros unidos na alegria da vitória, enquanto Mandela é conduzido na sua viatura, por entre a multidão, sem pressa, apreciando o sabor daquele momento.

Não é dos melhores filmes de Eastwood, embora seja conduzido com a habitual eficácia e sobriedade. Estranhei o tom demasiado "cor-se-rosa" do filme, como que premeditado para agradar e fazer-nos sentir bem à saída das salas de cinema. Não que isso seja mau, mas é atípico em Eastwood. Eu, que não percebo nada de rugby, sempre achei que não seria muito interessante por girar em torno desse desporto. E as cenas dos últimos minutos de filme, filmadas no estádio, misto de coreografias de força bruta e penalties, podiam ser mais breves! Mas a história improvável de uma equipa falhada - alvo até de uma anunciada extinção que Mandela interrompe - que se consegue superar a si própria, bem embrulhada na circunstância social africana da época, acaba por vencer. Para o que contribui a boa prestação de Morgan Freeman, claro. De um actor que até já interpretou Deus, outra coisa não se podia esperar.

Este é o poema vitoriano que Mandela diz ter-lhe dado inspiração nos piores momentos, poema que ele passa a Pineear, na convicção de que ele o irá também ajudar. O seu título, Invictus, dá nome ao filme. Leiam a tradução do poema escrito por William Henley, aqui.

Out of the night that covers me, - Do interior da noite que me envolve
Black as the Pit from pole to pole, - Negra como o poço de lés a lés
I thank whatever gods may be - Eu agradeço aos deuses que existam
For my unconquerable soul. – Pela minha alma inconquistável.

In the fell clutch of circumstance – Sob a garra do destino
I have not winced nor cried aloud. – Eu não me encolhi nem gritei alto.
Under the bludgeonings of chance - Sob os forçados 
golpes do azar 
My head is bloody, but unbowed. – A minha cabeça sangra mas não se rebaixa.

Beyond this place of wrath and tears – Além deste lugar de raiva e lágrimas
Looms but the Horror of the shade, - Vislumbra-se o horror da sombra apenas,
And yet the menace of the years – E no entanto a ameaça dos anos
Finds, and shall find, me unafraid. – encontra-me, encontrar-me-á, sem temor.

It matters not how strait the gate, - Não importa quão estreita é a passagem,

How charged with punishments the scroll, - quão carregado de castigos o pergaminho
I am the master of my fate; - Eu sou o senhor do meu destino;
I am the captain of my soul. – Eu sou o capitão da minha alma.

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